Casos desconhecidos protagonizados por Glória Maria

Em 1967 cursava o ginásio no Internato de Arari, o diretor Pe. Clodomir Brandt e Silva, assinou convênio com a Escola Federal Industrial do Maranhão, optei em fazer o curso profissionalizante de eletricista instalador, em cinco meses sagrei-me um profissional.

Em março de 1973 desembarquei na rodoviária Novo Rio no bairro São Cristóvão região portuária no Rio de Janeiro, perambulei pela cidade maravilhosa por dois meses, atraído por um classificado de jornal fui ao teatro Fênix, então centro de produção artístico da TV Globo, com o certificado conquistado no despretensioso curso de eletricista instalador fui contratado para o setor de manutenção, daí em diante me virei nos cento e vinte, em pouco tempo tive ao alcance de minhas mãos os maiores ídolos do mundo artístico brasileiro, como também, alguns jornalistas, apresentadores e âncoras globais.

Em uma tarde ao caminhar pela Rua Bartolomeu Mitre no Leblon sentido Gávea, me deparei com a repórter Glória Maria em carne e osso encostada na parede na porta de um prédio, vestia uma blusa simples, calça Jeans no meio da canela e calçava tênis, fitei aquela figura por alguns segundos, é óbvio que ela sentiu-se reconhecida por mim esboçando um sorriso muito discreto, tinha os dentes salientes, na época era bem dentuça, a reconheci de imediato, disfarcei minha curiosidade e segui meu trajeto, foi a primeira vez que a vi apesar de trabalharmos a uma distância de 4 quarteirões.

Em outra ocasião eu seguia na Rua Humaitá com destino a Casa de Saúde São José, antes de atravessar a rua para chegar ao hospital me chamou atenção uma jovem magra com uma bolsa a tiracolo marca Jeans com algo na mão, parecia uma barra de chocolate, enquanto o semáforo abria me deliciei admirando a Glória Maria, que naquela ocasião me foi mais acessível, estendeu a mão em minha direção e me deu um sorriso maior que no primeiro encontro, sinal liberado, fui a vida.

Em uma tarde na Praça da Cruz Vermelha próximo ao INCA ao me dirigir a Secretaria de Segurança me deparei com uma muvuca em um terreno onde levantavam a lona de um circo, de salvo engano era o Tihany, quando visualizei uma Caravan cor metálica com o símbolo do Plim, Plim, me aproximei e me deparei com a Glória Maria com uma tigresa recém-nascida na mão, ela de cabeça baixa acariciava o animal, incomodada com o assédio popular se desvencilhou pedindo com licença umas três vezes dirigindo-se ao veículo de reportagem, sentou-se na traseira da perua colocando o animal sobre o banco, em cinco minutos saiu do carro e gravou com o cuidador do felino, lembro-me que naquele dia o cinegrafista era o Garrincha, não sei que fim levou.

Nos anos 70 o bicheiro Castor de Andrade era patrono da Escola de Samba Mocidade Independente de Padre Miguel, no processo da contagem de votos na apoteose da Marquês de Sapucaí, Dr. Castor sambava de forma absoluta cercado por mulheres passistas das demais agremiações, a Glória Maria chegou por lá, se aproximou mas não teve êxito, a segurança era fortíssima e intensa, não permitindo o acesso nem a mosquito ensebado, a Glória Maria arrodeando aquele evento falando com um e com outro que ia apenas fazer somente uma pergunta, não sendo atendida na sua intenção.

O cerimonialista anunciou 9 minutos para o início da contagem dos votos, o contraventor cercado de Leão de chácara subiu para a tribuna de honra, a Glória Maria escalou uma grade e de frente para a maior autoridade do carnaval do Rio de Janeiro direcionou o microfone e gritou: —Dr. Castor, a justiça está procurando o senhor, há um mandado de busca e apreensão deferido pela justiça há mais de um ano nas mãos da polícia e oficiais de justiça e ninguém lhe encontra, como o senhor explica esse caso? Ele muito sorridente foi ao encontro da Glória e disse: —Eles não me encontram porque não querem, estou aqui, estou em todo lugar, sou presidente do Bangu e estou sempre nos estádios, agora por favor desça dessa grade porque você pode cair, e se retirou. Esse diálogo poucos privilegiados tomaram conhecimento, não sei porque cargas d’água as imagens foram veiculadas, mas a interação entre os dois foi editada. Essa prática existe até os dias atuais, se você que está lendo a matéria souber o nome disso me informe pelo amor de Deus. É importante informar que a época vivíamos a mais sangrenta ditadura existente no mundo.

Em um sábado acompanhei o vocalista Dadinho do grupo musical Tincoãs, para uma gravação no teatro Fênix, ao adentrarmos a Glória Maria estava sentada em uma lanchonete estabelecida no saguão na recepção, ocupava um banco no balcão degustando um refrigerante, nos aproximamos e a saudamos, ele disse estou sobre a hora para gravar, mas vou tomar um refrigerante gelado com essa maravilha da “cor”, ela respondeu: —Terei o prazer de pagar essa farra inesperada. Foi o último momento que eu estive com essa talentosa jovem enquanto empregado de uma terceirizada global.

Tivemos em outros momentos mais especificamente no processo de redemocratização do Brasil, lembro-me o mais significativo, a criação do PDT na sede localizado à Rua 7 de setembro próximo a Loterj no centro do Rio de Janeiro. Não sei exatamente quantas coincidências houveram esses encontros casuais, ela era muito atenciosa, carinhosa, delicada e gentil, tinha memória de elefante, falava com as pessoas tocando-as nas mesmas e pronunciando seus nomes, tinha o hábito de um breve diálogo arrumando a camisa, ajeitando a gravata abotoando um botão, com todos esses gestos cativava as pessoas, todas unânimes admiradoras, fãs e amantes desse ícone que nos deixou na manhã do dia 02 de fevereiro de 2023, coincidentemente no mês do carnaval, como carioca da gema amava a arte, alegria e a magia do samba que viveu intensamente.

Estou me referindo a casos que em sua maioria não foram veiculados e mostrados na telona do seu Roberto Marinho. Os demais que foram levados ao conhecimento da opinião pública mundial são incontáveis. É impossível que na trajetória da Glória Maria, tenha havido apenas e tão semente fatos jubilosos em virtude da sua própria condição familiar que não é necessário mencionarmos, enfrentou barreiras quase intransponíveis, muitos preconceitos, discriminações, retaliações, represálias, constrangimentos mil, inveja de derrotados, ciúmes e outros, entendo como o mais grave de todo a proibição do seu acesso a um hotel 5 estrelas em Copacabana, quando o gerente a proibiu verbalizando o seguinte crime: —Aqui negro não entra. A reação da Glória Maria foi a um Distrito Policial nas proximidades e registrou um boletim de ocorrência do malfadado crime, com base na Lei Afonso Arinos.

Esse gesto de indignação e revolta de vítimas desses canalhas devem ser levados às barras da justiça partindo de onde partir, eu, por exemplo, não permito em hipótese nenhuma que atos e fatos que possam atingir minha cidadania, deficiencia visual e outros, sejam contemplados com a impunidade, não respeito cara de ninguém dentro do meu direito. Tenho a honra, orgulho e privilégio que aprendi muito com essa minha colega de profissão que partiu para a eternidade.

Em 2013 estive em um evento na FIESPFederação das Indústrias do Estado de São Paulo, coincidentemente minha acompanhante me acomodou a uma mesa de seis lugares para o coffee break, na minha frente uma senhora orientada pelo meu crachá perguntou: você é jornalista de onde? De imediato reconheci a voz e respondi com ar de brincadeira, do Brasil, ela perguntou se eu a conhecia, respondi positivamente do Jardim Botânico no Rio de Janeiro, ela entendeu facilmente a mensagem e travamos um diálogo por mais de 20 minutos, quando ela ensaiou se retirar disse-lhe que acalentava um desejo de ser entrevistado por ela, por muito pouco não consegui, lamentavelmente foram formados grupos para debates de diferentes temas e perdemos o contato, embora ela tivesse me antecipado que estava trabalhando em um projeto voltado a pessoa com deficiencia.

Há um adágio popular que assegura, as grandes vitoriosas conquistas é estar no lugar certo, no momento certo e na hora certa, mas é importante termos o conhecimento e discernimento que tudo na vida depende de “merecimento”, exemplo tácito é um sortudo ganhador de milhões em uma loteria e em pouco tempo perde tudo, significa dizer que as garantias e prerrogativas para que alcançasse aquela vitória não concatenaram com a realidade dos fatos acontecidos em conformidade com os ensinamentos da metafísica, universo em desencanto e gnose, que nos orienta para entender a forma cósmica, missões e determinações superiores nesse plano terreno.

Carlos Amorim DRT 2081/PI

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Jornalista Carlos Amorim
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